Restauração não abre novos leitos para tratamento de queimados há 16 anos

Antônio Assis
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Folha-PE

A última ampliação de leitos no setor de queimados do Hospital da Restauração (HR), na área central do Recife, foi há 16 anos, em 2001, quando passou de 30 para 40. Não acompanhou o crescimento populacional, tampouco o aumento vertiginoso de pessoas queimadas, principalmente em 2017. Segundo o médico Marcos Barreto, chefe do setor, somente as crianças queimadas atendidas no HR ultrapassam os 1.600 casos por ano.

"A população aumentou muito e não tem mais para onde ir em termos de queimaduras. Além dos 40 pacientes dentro da unidade, tem ainda no corredor da emergência aguardando vaga, ou tira-se da emergência e se coloca em um dos andares, o que não é o local ideal", disse Barreto.

O médico atribui o aumento exponencial do número de queimados às altas do preço do gás de cozinha que já acumulam 54% este ano. "Essas pessoas não têm condições, não têm R$ 70, R$ 80 para comprar um botijão de gás e estão cozinhando com 'álcool de posto'", disse, referindo-se ao etanol anidro. "Já houve um caso aqui de chegarem três gerações queimadas dentro da cozinha, uma vó, uma mãe e uma neta". O médico observou ainda que tem aumentado o número de tentativas de suicídios com álcool. "As pessoas tomam banho de álcool e ateiam fogo. Semanalmente têm chegado casos aqui".

Por dia, são feitos, em média, mais de 30 procedimentos sob anestesia geral no setor de queimados do HR. "Um paciente queimado é uma família destroçada, todo mundo voltado para o tratamento. Muitas vezes é uma mãe de família que estava cozinhando e deixou 3, 4 filhos pequenos em casa sem saber nem com quem".

Marcos Barreto ressalta o custo do tratamento de um paciente queimado e o altíssimo índice de acidentes com crianças. "Se tirássemos as crianças da cozinha, tirássemos as gambiarras das casas e o álcool de dentro da cozinha, conseguiríamos eliminar 80% das crianças queimadas".

Botijão
No último sábado, sete pessoas da mesma famílias foram socorridas na unidade após o vazamento de um botijão de gás, em Jaboatão dos Guararapes, Região Metropolitana do Recife (RMR). Foram dois adultos e cinco crianças: Maria Betânia da Silva Balbino (24) e Roberto Balbino (62) e Tatiane Gabriel da Silva (8), Luciano Silva Balbino (9), Isabela Silva Balbino (5), Nicole Beatriz da Silva (3), além do bebê Daniel Rodrigo da Silva Balbino (1). Segundo o médico, todos têm queimaduras em mais de 30% do corpo, mas a situação mais grave é do bebê Daniel, que teve 90% do corpo atingido.“Ele esta na UTI na ventilação mecânica. As outras crianças e os adultos tiveram queimaduras de membros inferiores, superiores, face e queimadura parcial de tórax”, explicou.

Os sete devem passar por cirurgias reparadoras e fisioterapia motora. Roberto Balbino era o único que permanecia na emergência até a manhã de ontem, por fata de leito na unidade especializada. Com a alta de um paciente, ele foi transferido para a mesma ala da família à tarde.

Entenda o caso
Na manhã deste sábado (18), um princípio de incêndio aconteceu após vazamento de gás na Primeira Travessa da Castanhola, no bairro de Padre Roma, em Jaboatão dos Guararapes, Região Metropolitana do Recife (RMR).

O botijão era recentemente comprado e começou a vazar minutos depois de instalado. A esposa de Roberto, Rosilda da Silva, 43, contou que o marido comprou o botijão “de um rapaz que passou vendendo numa moto”. Ela não soube dizer a origem do produto. A filha do idoso e mãe de uma das crianças, Roseane da Silva Balbino, 22, comentou que foi o próprio vendedor que correu para avisá-la do incidente. “O que disseram foi que estava vazando gás e que estavam tentando consertar, mas alguém acendeu a luz e explodiu”, disse.

De acordo com o Corpo de Bombeiros de Pernambuco, a equipe chegou a ser acionada e, mas as vítimas foram socorridas por populares para a Unidade de Pronto Atendimento (UPA) do Engenho Velho – Carlos Wilson. Da UPA, os feridos foram encaminhadas para o Hospital da Restauração (HR). O fogo não chegou a se alastrar, mas atingiu o botijão e a mangueira.

Investigação do caso
No quesito investigação, a Polícia Civil de Pernambuco (PCPE) informou o inquérito sobre a explosão na casa da família Balbino já foi aberto. No dia do acidente, sábado (18), foi realizada uma perícia e o delegado que estava de plantão, Joaquim Marinosio, ouviu depoimentos. No último domingo (19), o inquérito foi passado para o delegado Victor Hugo Rondon, titular da Delegacia de Jaboatão dos Guararapes. Segundo a PCPE, toda semana, a Delegacia de Crimes Contra o Consumidor realiza duas fiscalizações para combater venda ilegal de gás. São conferidas as licenças do Corpo de Bombeiros; a ambiental; e da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP).

Já o Sindicato dos Revendedores de Gás Liquefeito de Petróleo do Estado de Pernambuco (Sinregás PE) lamentou, em nota, o acidente causado pelo vazamento de GLP na casa da família. A instituição destacou que a venda irregular do gás de cozinha, infelizmente, é uma prática comum e antiga no Brasil. O sindicato frisou que a população só deve adquirir o GLP de qualidade, com garantia de segurança e somente com nota fiscal através da revenda autorizada. Aproveitou para cobrar maior fiscalização do produto pelos órgãos competentes.

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